terça-feira, 9 de junho de 2009

Pra começar a discussão

Nos próximos posts, falarei do evento do SOS Mata Atlântica no Parque Ibirapuera. Nesse momento, apenas o cito pois foi nesse evento que tive chance de conhecer figuras da peleja ambiental de peso, seja no jornalismo com o nome de André Trigueiro (que eu não sabia que além de tudo é professor da PUC) e o Zequinha Sarney, do Partido Verde. Numa das rodas de debate, o caudilho Mário Mantovani reuniu e mostrou a Frente Parlamentar Ambientalista. E isso não é um partido, seita nem grupo eco-xiita. O mês de maio e junho foram muito quentes na discussão ambiental, a tal ponto de colocar o atual ministro Carlos Minc do Meio Ambiente na corda bamba sem garantia de continuar no cargo, pela postura do presidente Lula. Há uma necessidade evidente de contra-articulação para combater a dita "bancada ruralista", que no meio parlamentar foi ferozmente representada pela deputada Biskatia Abreu (DEM-TO).
Foram tantas baixarias legislativas nesse interlúdio (da coroação do bárbaro novo código florestal de Santa Catarina até a legalização da grilagem na Amazônia) que realmente dá a sensação que estamos rapidamente retrocedendo a passos gigantes no nosso sistema de proteção ao ambiente (falo com o cunho dos 3 pilares da sustentabilidade e não como ambientalista).
Como vou falar de outros assuntos no mês que ilustram cada um dos acontecimentos da maneira mais sintética possível, vou copiar aqui o artigo da Miriam Leitão do dia 5 de Junho que ilustra bem o pandemônio que estamos enfrentando na questão ambiental no momento...

A INSENSATEZ

Coluna de Miriam Leitão, O Globo, Sexta 5/jun

O confronto entre ruralistas e ambientalistas é completamente insensato. Mesmo se a questão for analisada apenas do ponto de vista da economia, são os ambientalistas quem têm razão. Os ruralistas comemoram vitórias que se voltarão contra eles no futuro. Os frigoríficos terão que provar aos supermercados do Brasil que não compram gado de áreas de desmatamento. O mundo está caminhando num sentido, e o Brasil vai em direção oposta. Em acelerada marcha para o passado. O debate, as propostas no Congresso, a aprovação da MP 458, os erros do governo, a cumplicidade da oposição, tudo isso mostra que a falta de compreensão é generalizada no país. A fritura pública do ministro Carlos Minc, da qual participou com gosto até o senador oposicionista Tasso Jereissati (PSDB-CE), é um detalhe. O trágico é a ação pluripartidária para queimar a Amazônia. Até a China começa a mudar. Nos Estados Unidos, o governo George Bush foi para o lixo da história. O presidente Barack Obama começa a dirigir o país em outro rumo. Está tramitando no Congresso americano um conjunto de parâmetros federais para a redução das emissões de gases de efeito estufa. O que antes era apenas um sonho da Califórnia, agora será de todo o país. Neste momento em que a ficha começa a cair no mundo, no Brasil ainda se pensa que é possível pôr abaixo a maior floresta tropical do planeta, como se ela fosse um estorvo. A MP 458, agora dependendo apenas de sanção presidencial, é pior do que parece. É péssima. Ela legaliza, sim, quem grilou e dá até prazo. Quem ocupou 1.500 hectares antes de primeiro de dezembro de 2004 poderá comprá-la sem licitação e sem vistoria. Tem preferência sobre a terra e poderá pagar da forma mais camarada possível: em 30 anos e com três de carência. E, se ao final da carência quiser vender a terra, a MP permite. Em três anos, o imóvel pode ser passado adiante. Para os pequenos, de até quatrocentos hectares, o prazo é maior: de dez anos. E se o grileiro tomou a terra e deixou lá trabalhadores porque vive em outro lugar? Também tem direito a ficar com ela, porque mesmo que a terra esteja ocupada por "preposto" ela pode ser adquirida. E se for empresa? Também tem direito. Os defensores da MP na Câmara e no Senado dizem que era para regularizar a situação de quem foi levado para lá pelo governo militar e, depois, abandonado. Conversa fiada. Se fosse, o prazo não seria primeiro de dezembro de 2004. Disseram que era para beneficiar os pequenos posseiros. Conversa fiada. Se fosse, não se permitiria a venda ocupada por um preposto, nem a venda para pessoa jurídica. A lei abre brechas indecorosas para que o patrimônio de todos os brasileiros seja privatizado da pior forma. E a coalizão que se for$a favor dos grileiros é ampla. Inclui o PSDB. O DEM nem se fala porque comandou a votação no Senado, através da relatoria da líder dos ruralistas, Kátia Abreu. Mais uma vez, Pedro Simon (PMDB-RS), quase solitário, estava na direção certa. A ex-ministra Marina Silva diz que o dia da aprovação da MP 458 foi o terceiro pior dia da vida dela. "O primeiro foi quando perdi meu pai, o segundo, quando Chico Mendes morreu" desabafou. Ela sente como se tivesse perdido todos os avanços dos últimos anos. Minha discordância com a senadora é que eu não acredito nos avanços. Acho que o governo Lula sempre foi ambíguo em relação ao meio ambiente, e o governo Fernando Henrique foi omisso. Se tivessem tido postura, o Brasil não teria perdido o que perdeu. Só nos dois primeiros anos do governo Lula, 2003 e 2004, o desmatamento alcançou 51 mil Km. Muitos que estavam nesse ataque recente à Floresta serão agora "regularizados" . O Greenpeace divulgou esta semana um relatório devastador. Mostrando que 80% do desmatamento da Amazônia se deve à pecuária. A ONG deu nome aos bois: Bertin, Marfrig, JBS Friboi são os maiores. O BNDES é sócio deles e os financia. Eles fornecem carne para inúmeras empresas, entre elas, as grandes redes de supermercados: Carrefour, Wal-Mart e Pão de Açúcar. Reuni ontem no programa Espaço Aberto, da Globonews, o coordenador do estudo, André Muggiatti e o presidente da Abras (Associação Brasileira de Supermercados) , Sussumu Honda. O BNDES não quis ir. A boa notícia foi a atitude dos supermercados. Segundo Sussumu Honda, eles estão preocupados e vão usar seu poder de pressão contra os frigoríficos, para que eles mostrem, através de rastreamento, a origem do gado cuja carne é posta em suas prateleiras. Os exportadores de carne ameaçam processar o Greenpeace. Deveriam fazer o oposto e recusar todo o fornecedor ligado ao desmatamento. O mundo não comprará a carne brasileira a esse preço. Os exportadores enfrentarão barreiras. Isso é certo. O Brasil é tão insensato que até da anêmica Mata Atlântica tirou 100 mil hectares em três anos. Nossa marcha rumo ao passado nos tirará mercado externo. Mas isso é o de menos. O trágico é perdermos o futuro. Símbolo irônico das nossas escolhas é aprovar a MP 458 na semana do Meio Ambiente.

Um comentário:

Rômulo disse...

Pois é, enquanto não se entender que a dicotomia 'ambiente' e 'desenvolvimento' não pode existir, estamos fadados a essas situações vexatórias e deveras comprometedora. Deve ser por isso que não dá mesmo para confiar na tal raça humana. Ô racinha!